O caixeiro poeta
Exigências de fortuna obrigaram-no a ir, muito criança ainda e muito a contragosto seu, servir como caixeiro de um parente (ofício embrutecedor que o perseguiria pela vida a fora), gastou ele aí a melhor parte de sua infância, incompreendido e anônimo. Mas, não podendo conter os ímpetos de sua alma em anseios de ideal superior, com José Barreto, Luís Felipe, Belfort e outros funda um jornal literário - O Iracema - onde aparecem seus primeiros versos, defeituosos ainda, mas já reveladores da inspiração e da originalidade daquele que mais tarde passaria a ser o principal representante do Simbolismo no Ceará, apesar da forte tendência romântica.
Sentindo o meio em que vivia intelectualmente atrasado para seus talentos, resolve seguir para Belém do Pará, em junho de 1888, onde trava conhecimento com o poeta João de Deus do Rêgo, que muito contribui para o seu aperfeiçoamento literário. Regressa dali, em 1891, doente e acabrunhado de esperanças. Por esse tempo aparece, na sua terra natal, um outro jornal literário - A Luz - em que Lívio publica sonetos e ligeiras crônicas humorísticas. Restabelecido no seio carinhoso da família, em fevereiro de 1892, ruma para a bela Fortaleza, onde se torna um dos fundadores (com o pseudônimo de Lucas Bizarro) da Padaria Espiritual - entidade literária que produzia o jornal - O Pão - tendo à frente o talentoso poeta Antônio Sales.
Intelectualmente satisfeito, mas afetado, fora do lar, por dificuldades financeiras, regressa ele como filho pródigo, acontecendo naufragar à altura da Periquara, em viagem no vapor Alcântara, salvando-se a nado, exímio nadador que era. Isto lhe rendeu um belo poema: “Náufrago”.
Segundo Artur Teófilo, “o Lívio era magro, pequeno, altivamente petulante.Tinha o olhar penetrante, sem vacilações, a fronte alta e abaulada e uma palidez baça de hepático. Ria pouco e só entre amigos deixava por vezes transparecer sua fina verve elegante, um bocado pessimista e epigramática. Com o vulgo era sisudo, um tanto frio mesmo, com uns longes de bem entendido orgulho. Usava casimiras claras, chapéu de feltro alto, e fumava cachimbo, à noite, embalando-se rapidamente na rede, com um livro de versos nas mãos.”
A morte prematura
Lívio Barreto, autor de um único livro - DOLENTES - publicado postumamente por Waldemiro Cavalcanti, faleceu na sua banca de trabalho, em Camocim, fulminado por uma congestão cerebral, pelas 3 horas da tarde do dia 29 de setembro de 1895. Ainda quase um garoto, com 25 anos, que lhe foram concedidos, tempo insuficiente para aprimorar sua técnica, tornou-se o maior poeta granjense de todos os tempos, e um dos principais do Ceará, ao lado de Padre Osvaldo Chaves, que certa vez o perifraseou de “o Casimiro de Abreu da Granja”. Lívio Barreto é patrono da cadeira nº 24 da Academia Cearense de Letras.
Foram seus pais José Soares Barreto e Mariana da Rocha Barreto. Lívio foi morar na sede Granja, onde chegou em 1878 e aí aprendeu, com o professor Francisco Garcez dos Santos, as primeiras letras.
Lágrimas
Lágrimas tristes, lágrimas doridas,
Podeis rolar desconsoladamente!
Vindes da ruína dolorosa e ardente
Das minhas torres de luar vestidas!
Órfãs trementes, órfãs desvalidas,
Não tenho um seio carinhoso e quente,
Frouxel de ninho, cálix recendente,
Onde abrigar-vos, pérolas sentidas.
Vindes da noite, vindes da amargura,
Desabrochastes sobre a dura frágua
Do coração ao sol da desventura!
Vindes de um seio, vindes de uma mágoa
E não achastes uma urna pura
Para abrigar-vos, frias gotas d’água!
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